Ainda faltam passar mais quatro até domingo. Outra eternidade.
Sete penosas noites, sete penosos dias.
Esta é, provavelmente, a mais longa semana da minha vida.
Adormeço a pensar no Rio Ave, acordo a pensar no Rio Ave.
Vivo e trabalho com um fantasma às riscas verticais verde e brancas diante de mim, a perturbar-me o espírito, a consumir-me a alma.
Não tenho fome.
Tenho sim pesadelos com o Bruno Gama, com o Bruno Moraes, e até com o Chidi.
E, sobretudo, com uma inesperada festa azul e verde a inundar o país no domingo à noite.
Não. As coisas não podem correr mal. Afinal estarão onze craques no relvado, 65 mil a gritar nas bancadas, e milhões lá fora a torcer com muita fé.

Desta vez chega um desses empatezinhos, como os daqueles dias em que nada bate certo, em que o raio da bola se recusa a entrar.
E, se tudo o resto falhar, se tudo desgraçadamente falhar, se até esse empatezinho nos quiser fugir, ainda sobra uma remota esperança situada lá pelo Atlântico.
Que diabo, seria preciso muito azar...Muito azar mesmo.
Mas...são onze de cada lado.
Onze profissionais de futebol, uma bola redonda, e duas balizas do mesmo tamanho. E se ela, a bola, entrar na baliza errada?
Temo uma dramática demonstração da Lei de Murphy, temo um “Maracanazzo” à portuguesa, temo os nervos a tolher as pernas dos jogadores. Temo as ausências do Fábio, do Di e do Javi, temo a lesão do Óscar. Temo a inspiração do guarda-redes adversário. Temo a arbitragem. Temo, sobretudo temo. Temo muito. Temo tudo. Aterrorizadamente.
Mas não, não pode ser.
Em catorze jogos em casa o Benfica empatou um e venceu os restantes. Foi sempre a melhor equipa. É a melhor equipa. Muito melhor que todas as outras. Quem é afinal o Rio Ave?
Não. Nada pode falhar. Nada vai falhar.
E os dias não passam.
É terrível a angústia do adepto no momento da incerteza. Sabendo apenas que, dentro de quatro dias e quatro noites, ou irá poder dançar sobre as doces nuvens do paraíso, ou cairá desamparado nos mais profundos alçapões do inferno, não havendo quaisquer terceiras vias por onde escapar.
Mas não. As coisas não podem correr mal.
O Rio Ave tem dois centrais lesionados, há oito jogos que não ganha, e nesses só marcou um golo. Há cinco partidas que não mete uma só bola dentro de qualquer baliza. Como poderá marcar a Quim, ao grande Quim? Como? Além disso nunca ganhou na Luz, e a história sempre tem algum peso nestas coisas. E os 65 mil? E os 6 milhões?
Não. Nada pode falhar.
O futebol não nos devia fazer passar por isto. Mas faz.
Aperta o coração, brinca com as nossas emoções, divertindo-se, ele, sarcasticamente, à custa do nosso sofrimento. Se os jogadores do Benfica entrarem em campo com metade desta terrível ansiedade de adepto, estaremos todos perdidos. Nós e eles, ou eles e nós, o que vem a dar no mesmo.
Mas confio naquela gente. Em todos eles. Nos que jogam sempre, mas também no Airton, no César, no Weldon, no Carlos, no Ruben, no Nuno, e até no Pedro se for preciso. Se foram capazes de coisas fantásticas, se foram intérpretes de tantas sonatas, não iriam cair do palco agora que o pano já desce e a apoteose os espera. São fortes, muito fortes, e não vão tremer. São campeões. Vão ser campeões. Vamos ser campeões.
Ainda faltam quatro noites e quatro dias.
Quatro noites e quatro dias de inquietação e agonia. E depois, mais noventa minutos de arrepiar a espinha. Como resistirei? Como resistiremos?
Tudo em noventa minutos. Uma vida em noventa minutos. Tinha razão o Shankly. Se calhar até mesmo a Florbela, quando escreveu:
“Minha alma de sonhar-te anda perdida,
Meus olhos andam cegos de te ver,
Não és sequer razão do meu viver,
Pois que tu és já toda a minha vida”
E a vida, essa vida, pode mesmo acabar alí. Ou não. Como numa roleta russa em que sabemos haver uma bala, mesmo que uma só bala, para nos liquidar.
Força Benfica! Que tenhas mais força do que eu para viver os dias que faltam até nos voltarmos a encontrar na tua casa. Na nossa casa.
E lá, que Deus nos ajude a agarrar aquilo que é nosso. Depois…depois não haverá amanhã que cale a nossa alegria.
0 komentar:
Posting Komentar